
Bolo de cenoura e beterraba, presentes, convidados especiais e um canto de parabéns mais baixo para não assustar: assim foram celebrados os 40 anos do cavalo Halifax, da raça anglo-árabe, que faz aniversário nesta terça-feira (22) e vive em um alojamento em Araçoiaba da Serra (SP). A marca é considerada um feito raro por especialistas, já que a expectativa de vida média de um cavalo está entre 25 e 30 anos.
Romeu Sérgio Osório, proprietário do alojamento onde Halifax vive, destaca que diversos fatores contribuem para que os equinos não consigam atingir ou ultrapassar o tempo médio de vida. Muitos estão relacionados à negligência dos tutores, segundo ele.
“Problemas nos dentes, no sistema digestivo, infestação por carrapatos, o descuido de donos que acreditam que a rusticidade de um equino é permanente, uma alimentação não adequada, principalmente deixado a pasto de capim braquiária, são algumas das causas que abreviam a vida de um cavalo”, cita.
Condições que refletem, conforme Romeu, o abandono de muitos cavalos que, após anos de trabalho no campo ou em pistas de equitação, acabam descartados quando já não conseguem mais exercer suas funções.
Esse quase foi o destino de Halifax, que, aos 20 anos, foi entregue pela antiga proprietária a Doris Wiegandt, alemã que decidiu proporcionar ao animal uma aposentadoria digna.
“A antiga proprietária passou o cavalo para Doris, com documentação e tudo. Daí ela conheceu o nosso alojamento, gostou do lugar, e trouxe ele para cá. Já são 20 anos de dedicação ao Halifax”, relata Romeu.
Desde então, um grupo de especialistas e apaixonados por equinos orbita o ‘universo Halifax’, como Romeu chama, para garantir que o animal idoso receba todos os cuidados possíveis. Entre eles, está o veterinário Luiz Américo, especialista em cavalos, que afirma que a marca atingida pelo animal está muito acima do esperado.
“A expectativa de vida melhorou nos últimos anos, porque antigamente era de 25, agora foi para mais ou menos 30 anos. Mas o Halifax é resistência. A rusticidade dele e o bom cuidado fazem com que aumente a longevidade. Dos cavalos que eu conheço, ele é o mais velho que já vi.”
Romeu concorda com o veterinário. Ele acredita que a alimentação adequada e a rotina livre foram determinantes para que Halifax superasse a média de vida da espécie.
Aos 40 anos, o cavalo já não tem quase nenhum dente, a visão está comprometida e o pelo branco começa a dominar seu corpo, sinais claros de uma vida longa. Neste período, os cuidados são ainda mais reforçados, segundo Romeu.
“Ele praticamente não pasta mais. Então, como ele come? Nós damos o verde [capim] para ele, que é, digamos assim, 70% a 80% da alimentação do cavalo para ele ter a boa digestão. Também damos uma ração de alfafa peletizada, a alfafa é a ‘rainha’ das leguminosas, além de uma outra ração que normalmente é dada para os potros, que é de alta digestibilidade e tem 14% de proteína. E também damos duas vezes por semana sal mineral adequado para ele. Alimentados ele de manhã e à tarde, substituindo o pasto que ele já não consegue aproveitar sozinho”, explica.
Apesar das limitações impostas pelas velhice, Halifax ainda demonstra disposição para percorrer os três alqueires do sítio onde vive e até se esforça para pegar mangas direto da mangueira. O animal lembra da rotina, dos cuidadores e até parece sentir saudade de ‘amiga’ que precisou ir para outro sítio.
“Ele vê meio de longe assim, e também ouve a gente. Ele conhece a rotina dele, vai para lá, vem para cá. Uma situação que ocorreu recentemente que nos deixou chateado é que tinha uma égua aqui que ele tinha ficado amadrinhado com ela, só que essa égua foi embora e ele sentiu muito, porque era companhia para ele”, completa.
Além da longevidade, Halifax também conquistou o carinho de quem cuida diariamente dele, como o caseiro Elber Pereira Flauzino da Silva, que faz questão de cobri-lo com uma manta para mantê-lo aquecido nas noites mais frias.
“Eu montei ele muitas vezes, ele foi para mim um cavalo-professor. Ele é um cavalo que, como ele sofreu lá no início, cavalo de hípica, era um pouco cabreiro, mas depois foi adoçando. O nosso caseiro aqui gosta muito do Halifax. A Doris até hoje fala: ‘Faça o que for necessário com o Halifax’. Então, se ele tem uma dor disso, uma dor daquilo, já chamamos o veterinário. Ela continua investindo na saúde e na vida dele. É um compromisso com o cavalo”, ressalta Romeu.
A tutora de Halifax foi a responsável por servir a ‘fatia’ de bolo para o aniversariante, a quem ela chama de ‘companheiro fantástico’.
“Eu montei aqui com ele. Ele é um companheiro fantástico. Fizemos muitos passeios lindos, com toda essa família, com meus netos. Para ele, continua sendo gostoso ficar aqui. Ele é muito bem cuidado”, afirma Doris.
O proprietário do alojamento torce para que Halifax ainda tenha mais alguns anos de vida ao lado de toda a turma que se uniu em função do animal, mas acredita que chegar até a idade que chegou, depois de quase ter sido abandonado, já é motivo de muita celebração.
“Eu costumo dizer isso: que cavalo é um bicho extremamente frágil, ele tem um sistema digestivo frágil, ele apoia em quatro dedos. Então, se ele tiver algum problema de casco, ele morre, porque ele não vai conseguir buscar o alimento dele, e não é qualquer coisa que ele pode comer, não, ele é seletivo. Então, para mim, ele ter chegado até essa idade já é um milagre, sinto que ele cumpriu a missão.”
Fonte: G1 – Sorocaba e Jundiaí