Carrie faz 50 anos

O finalzinho de março passado marcou os 50 anos do lançamento do livro “ Carrie”, do escritor norte-americano Stephen King. Incluído pelo jornal The New York Times na lista dos Cem Melhores Romances do Século Passado, o nascimento de “Carrie” para o grande público tem uma história atribulada.

Seu autor, na época, era um anônimo professor de Literatura numa escola desconhecida do estado do Maine, nos Estados Unidos, equivalente mais ou menos  ao nosso Piauí, no cu-do-Judas ianque. Drogado e com sérios problemas com a bebida, King mal tinha grana para pagar as contas do mês. Vivia ao Deus-Dará, do salariozinho de professor e recebendo minguados dólares por contos que conseguia publicar em revistas variadas.

Reza a lenda – nunca confirmada por nenhum dos envolvidos – que de saco cheio com a vida King jogou os originais de “Carrie” no lixo, deu as costas e foi embora, já que mais de 30 editoras haviam recusado o manuscrito. Sua esposa Tabitha, contrariada, tirou os papéis do lixo, ajeitou-os dentro de um envelope selado e como alguém que não tem nada a perder mesmo enviou-os à Doubleday, não por acaso a maior editora dos Estados Unidos e para a qual King nem se atrevera a mandar o pacote. O resto é história.

A Doubleday comprou os originais de “Carrie”. Mandou ao seu autor um cheque de adiantamento de 400 mil dólares. Começa aqui a lenda de Stephen King, hoje milionário, com mais de 400 milhões de livros vendidos no mundo e o autor mais adaptado para o cinema, tv e séries. Está sempre entre os 5 Mais TOPs dos escritores mundiais, quando a mídia resolve soltar alguma listinha nesse sentido. King ficou rico, famoso e badalado graças à Carrie. Mas quem é ela? Quem leu o romance sabe e para quem não leu vou dar uma ideia aproximada.

Carrieta White, ou a “Carrie” do título é uma adolescente problemática. Filha única, foi criada por uma mãe solteira que virou evangélica fanática e vive atazanado a vida da coitada da filha. No colégio a coisa então vai muito pior. Zoada por todos, Carrie é humilhada no banheiro das meninas quando sofre sua primeira menstruação, já que não sabia o que era aquilo: mamãe nunca tinha lhe falado nada, já que abomina sexo sob qualquer forma. Então, fica surpresa quando numa votação popular é escolhida a Rainha do Baile da escola. Ela nem acredita, coitada. Na festa, é coroada ao som de música fofa e luzes estrambocópicas ao lado do garoto mais bonito da turma. O paraíso é aqui e Carrie vive um sonho de redenção: tudo armação, claro. A galera do mal quer mais é tirar uma na cara da Carrie, pobre trouxa pobretona. Favelada.

O que ninguém imagina é que Carrie é portadora de uma síndrome raríssima: a telecinesia. Quando fica braba, sai da frente: consegue mover objetos com a força da mente. E Carrie, como todos sabem, vai ficar muito puta da vida no tal baile, quando alguém despeja um balde cheio de sangue de porco na sua cabeça. E no seu belo vestido, que deu tanto trabalho para ela mesma costurar! E assim segue o livro de King, na prosa instigante e assustadora à qual todo mundo iria se habituar e virar fã.

Depois de vender milhões de cópias, “Carrie” foi levada à telona pelas mãos mágicas de Brian de Palma. O baixo orçamento do filme não permitiu que a grande apoteose final, sangrenta e macabra, fosse igual ao livro: neste, Carrie destroi quase a cidade inteira com seus poderes telecinéticos. No filme, apenas a escola e suas cercanias. Mas ninguém ligou não, já que de Palma dividiu a tela em 4 e todos os ângulos da carnificina ficaram bem visíveis, com mortes coreografadas bem bacanas. Outras “Carries” vieram depois, no cinema, mas ninguém nem se lembra delas, já que a original (Sissy Spaceck, magnífica) não deixou o papel para mais ninguém.

Acredito que, se não tivesse morrido, Carrie, hoje, aos 50, continuaria tão perigosa, ou mais, do que antes. Movimentando tudo à sua volta, só com um olhar, já pensaram? Erguendo caminhões com a força do pensamento! Atirando mesas e cadeiras na cara da gente! E aqueles que pixaram “Carrie come bosta no inferno” na sua lápide, deveriam se precaver. Afinal, em livros e em filmes de terror o monstro nunca morre!

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CARLINHOS BARREIROS:

É professor, jornalista e escritor. Atuou em Piraju nos jornais “Folha de Piraju”, “Observador” e “Jornal da Cidade”, sempre como cronista ou crítico de Cinema/Literatura. Publicou o livro de contos “Insânia: O Lado Escuro da Lua” (esgotado). Em 2006, foi o primeiro colocado no Concurso de Poesias, Contos e Crônicas da FAFIP (Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Piraju) com o conto “Sade no Sertão”.

Atualmente, revisa os originais de seu livro de contos ainda inédito, “Freak Show”. Mora em Piraju, onde contribui eventualmente com a imprensa local com crônicas/contos e escreve para os blogues farolnoticias.com.br e “Língua de Trapo”, ambos da cidade de Itaí.

Seu ensaio sobre a contracultura em Piraju nos Anos 60 e 70 do século passado: “Eu, Carlinhos Barreiros, drogado e prostituído” foi publicado com sucesso no blogue da USP (Universidade de São Paulo), do jornalista Luciano Maluly, ficando no top dos Mais Lidos por várias semanas.

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